Páginas

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

MORRER NÃO DÓI NADA

Um virou pro outro e disse que facada doía muito mais do que tiro.

- Por quê?

- Ué, porque o tiro esquenta e a facada é fria, dói, mas muito mais. Você já tomou uma facada?

- Eu não! Tá maluco? Nem tiro levei muito menos.

- Facada dói pra caramba, bicho. – Ainda era comum tratar amigos assim, coisa que muda com o tempo. Já teve o “meu chapa” e o um pouco mais carinhoso “chapinha”. Era assim que o Zé Pretinho me chamava quando eu ia na sua venda comprar chicletes. Cada um Ping-Pong “tutti-frutti” custava dez centavos de um cruzeiro que a gente, imitando os adultos, chamava de “mil”. No site de respostas do Yahoo achei um pequeno histórico desses chicletes:

O primeiro chiclete vendido no Brasil foi o “Ping Pong” lançado pela Kibon em 1945 e concorreu com o Ploc durante muito tempo, até que ambos foram comprados pela empresa Kraft Foods, que fundiu as marcas (o Ping-Pong era da Kibon e o Ploc era da Adams). O Ping-Pong era extremamente duro, custava para amolecer - haja maxilar! Algumas pessoas gostavam porque isto tornava a bola mais resistente, mas, quando surgiu o Ploc, super macio, o Ping-Pong foi perdendo terreno.

 
Quando o papai ia sair de casa a molecada o cercava pedindo “um mil” para comprar guloseimas na venda do Zé Pretinho. Enquanto revirava os bolsos da calça – não me lembro de ter visto meu pai usar carteira – o homem costumava dizer sorrindo que parecíamos um bando de pintinhos ciscando à sua volta, piando: mil, mil, mil...

Para isso tem outra explicação dá época de minha infância, agora vindo da Wikipédia:

Em 13 de fevereiro de 1967, o Cruzeiro foi substituído pelo padrão transitório Cruzeiro Novo (NCr$) por conta do aumento da inflação. O Cruzeiro Novo equivalia a mil Cruzeiros "antigos", como ficou denominada esta moeda.

Essa era a nota de um Cruzeiro "da minha época", começou a ser impressa em 1970.
 
- Eu me meti numa confusão uma vez lá num bailão da Serra, o lugar era meio barra pesada, mas eu tava de olho numa garota de lá. E tinha um cara esquentado que não gostava de gente de fora paquerando a muierada, do nada ele partiu pra cima de mim e me sentou umas três facadas. Eu preferia mil vezes ter tomado um tiro.

- Tá doido meu irmão...

- Tiro é só costurar, ou então mata de uma vez. Mas pra tratar a facada o médico enfiou com tudo o dedo lá dentro da ferida pra tirar o sangue coagulado e limpar. Rapaz mais aquilo doeu! – Me acerquei da dupla achando graça naquela conversação e comentei: “deve ser daí que tiraram a expressão colocar o dedo na ferida”. E o mais sem noção, aproveitando o ensejo, falou:

- Juca, sua mãe morreu de tiro não foi?

- Foi.

- Então...

- Então o quê?

- Não deve ter doído nada...

P.S. Guardem as facas crianças, porque esse diálogo final é fictício. Serve para continuar lembrando que a jornalista Maria Nilce Magalhães morreu assassinada em um crime de mando perpetrado por gente da elite financeira capixaba. Gente muito fina que comprou sua impunidade e contou com a conivência de um sem número de autoridades de forma que até hoje passam por cidadãos respeitáveis e são homenageados pela imprensa e por seus iguais.

Como agora é moda dizer: VERGONHA ALHEIA!

Djalma Juarez e Maria Nilce Magalhães com o filho Juca no colo, circa 1966.

3 comentários:

Anônimo disse...

Еverything іѕ vеry open with a гeallу clеar explаnatіon оf the
challеnges. It ωаs truly informatіve.

Υour websitе is νeгy useful. Mаnу thаnκѕ for shaгіng!


Here is mу blog ρost - green stinger ephedra

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto de ficção! Antagônicamente, por um instante, lembrou-me o neorrealismo de Vittorio De Sica, tamanha a lucidez.

Juca, tudo pode ser criação literária. O diálogo final pode ser fictício, cheio de imaginação, mas tem muita semelhança com uma sociedade simulada, fingida, própria da ficção cinematográfica. Você disse "vergonha alheia"... e eu chego a crer que na ficção alguns se fazem alheios de si, mostrando-se "distraídos", mergulhados em seus pensamentos e se esquecendo de seus semelhantes, em surto de egoísmo e ganância, quando tudo é provável que aconteça e vire fato. Não é ficcional? Depende do ângulo da câmera e da cena. Nessa ficção mais do que "real", amigos do alheio e aproveitadores da sociedade preencheriam perfeitamente o seu "post-scriptum".

Souza

Anônimo disse...

It's awesome for me to have a web page, which is good designed for my know-how. thanks admin

My web site ... Chemietoilette
my page - yawp.mobi