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domingo, 27 de fevereiro de 2011

PASSANDO O CARNAVAL DE CARA


Faz pouco tempo vi uma reportagem, nem lembro mais onde, sobre pessoas que ficam deprimidas porque hoje têm uma grande opção de diversão, mas não conseguem curtir "paul newman"- isso é o que dá se querer frequentar. Quem diria o mundo moderno dar luz a essa nova espécie de impotentes sociais, brochas da modernidade e suas misteriosas caretices? Aliás, Auldous Huxley disse, mas quer razão mais careta pra ficar na pior?

É justamente a sensação que eu tinha com o carnaval quando adolescente, eu que vivia no meio da bagunça de repente me via num mato sem cachorro porque “bom sujeito não era” e ao invés de contagiado pela insistente alegria obrigatória era assediado por uma curiosa tristeza. Até hoje, embora bem menos, as marchinhas de carnaval e o sambão me trazem à memória lembranças tristonhas e amareladas. Não sei bem dizer por quê.

Apesar de minha mãe (a colunista Maria Nilce) ser uma espécie de ícone para a comunidade carnavalesca e frequentemente flertar com as festas populares, tendo até desfilado no Sambão do Povo em 1988, ela e papai eram muito caseiros e avessos a muvucas, beiravam o esnobismo. Mamãe dizia que futebol, cerveja e churrasco eram coisas de gente sem cultura. Ora, eu me considero um homem razoavelmente culto e, apesar de passar muito bem sem os dois últimos e não ligar a mínima para o primeiro, não sou de dispensar uma boa bagunça.

Suponho que foi dona Marízia quem inventou de levar a meninada toda pro baile de carnaval do Clube Vitória, a saudosa sede social que ficava ali em frente ao Parque Moscoso. Eu era amigo infantil de Flávio e Cezinha, seus filhos; André, o mais velho, no futuro viria a se envolver com o Gratz naquelas confusões que todos devem se lembrar. Como a parada era “a fantasia” e destas eu não tinha, o jeito foi improvisar: me enfiaram dentro de um amarrativo quimono e logo tudo ficou “Guarapari”.

Curioso baile de carnaval, curiosas convenções sociais: confetes, serpentinas, Pierrô e Colombina. Pseudo-fantasiados dando voltas giratórias em um grande salão, como fantasmas, arrastando correntes. Não consigo lembrar daquilo com alegria, nem de algum deslumbramento infantil, tudo que me lembro é de gente suada, crianças desnorteadas e sorrisos falcatrua. Sede, refrigerante, o velho piso de tacos muito comum na época. A decoração de máscaras e as marchinhas cinqüentenárias que, não fosse a axé music, passaríamos escutando pelo resto da vida nessa época do ano.

Drama pra achar o banheiro naquela confusão – quantos anos será que eu tinha, oito? – drama maior para me livrar daquela amarração da roupa – como é que faz xixi? – na confusão e na urgência da bexiga ao invés de desatar as calças, aí foi que eu amarrei mesmo a cordinha do quimono. Não teve jeito mané, fiz que nem o Zé Coisado do Livro do Pó: relaxei e continuei a canção. Poderia dizer pra vocês que eu combati o bom combate, que não estava nem aí pro que aconteceu, mas não foi assim. Quase morri de vergonha. Qual criança não morreria?

Da vida adulta em diante passei a colecionar boas lembranças carnavalescas, especialmente porque entendia que aquilo tudo era apenas mais uma convenção social das tantas que somos compelidos (obrigados?) a comparecer para parecer que somos parte de um mesmo povo, com o mesmo gosto musical, o mesmo sangue milenar, as mesmas convicções espirituais e usufruir um pouco da hoje tão falada “sensação de pertencimento”. Fui até jurado de desfile de carnaval uma vez (!) experiência, aliás, que dará breve outro texto.

Essas palavras não vão só para aqueles que não entendem e sim para que todos saibam que o famoso “Bloco do Eu Sozinho” geralmente tem já uma pancada de gente...

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

DE GENTE QUE FAZ CARROS QUE GOSTAM DE PESSOAS


Qual é a parte mais feia do seu corpo?
Uns dizem que é seu tornozelo
Outros que é o seu nariz
Mas Eu acho que é a sua mente.

Frank Zappa

Alguém aí já assistiu ao filme “Histórias Verdadeiras”? Foi dirigido e concebido por David Byrne da banda Talking Heads, reza a lenda que, a partir de histórias bizarras encontradas em revistas e jornais e colecionadas ao longo dos anos dentro de uma caixa de sapatos. Eu tenho costume de fazer coisa semelhante, só que guardo em uma hoje abarrotada caixa de camisa social da marca “Presidium” para ser bem capixaba.

O filme foi lançado em 1986 e trouxe a reboque uma série de canções de sucesso como Wild Wild Life e Love For Sale. É considerada uma história estranha pela maioria dos “críticos de cinema”, mas eu adoro o senso crítico e o humor ácido que permeia a produção. Do meio pro final rola um “show de talentos sob as estrelas” que começa com o mestre de cerimônias contando a seguinte historinha...

“Na época da criação do mundo Deus estava fazendo o Texas, se esforçando para que ele fosse tão bonito como os outros lugares do planeta. Então anoiteceu e Deus disse: “Amanhã eu volto e termino o trabalho colocando rios, lagos, montanhas e árvores”. Porém, no dia seguinte o chão estava duro como cimento e Deus não se animou a começar tudo de novo, em sua infinita sabedoria falou: “Já sei o que fazer: vou criar pessoas que gostem desse lugar exatamente do jeito que ele é”.

Esse é o princípio do conformismo, aquela idéia pragmática - e um tanto perversa - que surgiu para adaptar o sujeito a uma determinada realidade de maneira que possa ser produtivo e útil para seu grupo social. Ah sim: e quem sabe “ser feliz”.

Existe uma piada famosa sobre esse assunto, acho que a ouvi nas épocas da faculdade, quando estudei psicologia social:

“Um sujeito sofria de incontinência e vivia passando vexames se borrando todo em lugares públicos. Tentou várias formas de solucionar o problema: tomou remédio, fez acupuntura, hipnose, só não usou fralda. Nada adiantava. Um dia foi recomendado por um amigo a um psicólogo que resolvia qualquer parada. Passadas algumas semanas encontrou o amigo e curioso este perguntou:

- Como foi lá com o psicólogo?

- Hi rapaz foi uma maravilha! Tenho muito que te agradecer! – Daí o amigo baixou a voz e perguntou curioso, quase como em segredo:

- Quer dizer que agora você não está se cagando mais?

- Estou sim, to sim. Só que agora eu não estou nem aí...

Sabe por que lembrei dessas histórias verdadeiras? É que tem uma propaganda de carro passando na tevê, e como tem destas, que tem uma frase bem tola assim: “porque pessoas que gostam de carros vão saber que existe gente que faz carros que gostam de pessoas”. O autor da façanha deve ter assistido ao filme do Byrne também... E devia ser processado. Não por plágio, mas pelo "criativoso" uso - e abuso - do mau gosto.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

E NO SÁBADO ACABA O HORÁRIO DE VERÃO



Início de ano tem umas coisas que atentam nossa atenção, captam, capturam. O horário de verão é uma delas, não é ótimo tomar um puta sol no meio da cara às sete da noite? Tem um monte de gente que gosta. Sabe? Acho que a melhor definição para democracia é: quando você deixa as crianças escolherem o que vão comer. Os processos democráticos são perigosos e se aproveitam das ditaduras que são inaceitáveis: a maioria das pessoas precisa estar na superfície, onde criam estratégias para se alimentar, mas mergulhar atrás de pérolas... Talvez seja preciso algo realmente novo.

Me perguntava por que começou o Big Brother esse ano e ainda não tinha perdido o meu tempo, como diz Pedro Bial, dando uma “espiadinha”... Tanta coisa melhor pra “espiar”. Da mesma maneira não sei dizer bem a razão de ter acompanhado as duas últimas temporadas, não costumo ver televisão. Ontem acabei vendo,  os dias de eliminação são os mais animados, é como um moderno sacrifício aos leões ou, novamente como disse o “apresentador de sorriso mastigado”: “Uma pequena morte”.

Já repararam no sorriso que o Bial tenta fazer para a câmera quando encerra a sua participação? Ele fala aquele monte de breguétes dele e no final olha para onde imagina estarmos sentados, morde as bochechas por dentro da boca, abre os lábios, aí por uma fresta podemos ver os seus dentes... Não sei não, mas se é isso o que ele parece entender como o sorriso mais naturalmente amigável de seu repertório, eu não gostaria de o ver forçando a barra.

Foi então que lembrei da temporada do ano passado, quando ficou claro que a grande maioria do público é preconceituosa e escolhe endeusar os mais arrogantes, os estúpidos, as lideranças agressivas. Talvez não o façam por acaso, afinal “vivemos na selva” e “é preciso matar um leão todos os dias”. As tribos escolhem os que têm uma melhor habilidade de mostrar força - mesmo quando truculência - e certeza, quando tantas existem e sempre existirão.

Ontem também vi o Senador Magno Malta num programa local da Band, adotando enfático esse discurso assertivamente agressivo. E, como bom cristão, justificava sua fala dizendo algo como “quem fala mole não é de confiança, o justo tem um discurso firme”. Afirmação plenamente comprovável, visto as coisas prodigiosas que conseguiu fazer o mais contundente orador do século passado, o conhecido Adolf Hitler. É companheiro, “temos que endurecer, porém sem perder a ternura jamais”.  

Fico pensando o que outros cristãos têm a dizer de afirmações do gênero, afinal uma das frases mais famosas de Jesus é: “bem aventurados aqueles que são brandos e pacíficos, porque herdarão a terra”.  Enquanto isso o pastor cuida de ovelhas e não de lobos, estes sabem bem se defender. Uma das maiores questões sociais que vivemos é essa antropofagia, um é devorado pelo outro, e o maior problema é que todos são instigados a ser essa coisa e não aquela.  

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

ENQUETE ONLINE FAKE COMO ELA SÓ...



O que você achou da frase

“Quem não tem dinheiro para pagar estacionamento, não deveria ter carro. Ponto e basta. Quá...Quá...Quá...” Das “Linhas Malditas” no site da Revista Class.

Algumas respostas até agora

a) Quem não tem dinheiro pra pagar condomínio deveria, assim, assumir a sua condição de “sem teto”...
b) Eu achei a risada super last season a moda na net é kkkkkkkkkkkkkkkkkkk
c) Quem não tem dinheiro para ser roubado não deveria ser assaltado. Ê bandidagem ignorante.
d) Eu não achei nada, mas Perivaldo correndo pela ponta esquerda achou um cordãozinho de ouro maneiro.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

SANGUE, SUOR E LÁGRIMAS DE CROCODILO

Alô alô cidadão capixaba. Diz aí o que você entende da notícia abaixo: 
"Doador de sangue no ES paga meia no cinema em eventos culturais"
a) Agora tem que dar até o sangue? 
b) Quando for pra doar os órgãos me avisem. 
c) E na farofa não vai nada não?
d) Cultura como assim cara pálida?

RAPIDINHAS CULTURAIS SUSTENTÁVEIS!


O ser humano é curioso, temos, por exemplo, o costume de fazer graça com a desgraça alheia. No Saturday Night Live da outra semana mesmo andaram fazendo piada com a bagunça no Egito. Dizem que o povo por lá é muito paciente, afinal esperaram trinta anos pra resolver tirar o ditador. O mesmo aconteceu com as dez pragas de Moisés, foi preciso a água virar sangue, enxame de gafanhotos, o diabo à quatro pra alguém tomar providência.

O Egito me lembra também o impagável livro que o Pedro Collor escreveu (cometeu?) contra o próprio irmão ”O Fernandinho Saco Roxo” de triste lembrança. A obra ficaria famosa por conta do episódio com os supositórios de cocaína, lembram? Mas um dos alvos prediletos do abilolado irmão do presidente era a primeira dama, Roseane, Rosane, alguma coisa assim.

Disse que o casal voltou de uma viagem ao exterior (talvez lua de mel, sei lá) e a Rosane contava em uma roda animada que os dois tinham ido ao Cairo e depois seguiram para o Egito. Todos riram constrangidos e o maridão aparteou, dando a entender que a esposa estava fazendo uma brincadeira a “La Juca Chaves”, saca? Primeiro eu fui a Portugal depois eu fui pra Europa? Não colou, mesmo porque rolou o diálogo que segue:  

- Ô Rosane, o Cairo fica no Egito meu bem...

- Não, não amorzinho. Olha só... – Aborrecido Collor encerrou o assunto agora sério:

- Rosane o Cairo fica no Egito e em casa a gente conversa...


E vem aí o lançamento do disco do nosso queridão Carlos Papel, o internacional Charles Papper. O dísculo tem a ver com o próprio já que o título “Fora do Eixo” vem com patrocínio da cachaça Melindrosa. O discóbulo será lançado no Theatro Charles Gomes no próximo dia 10 com uma banda de primeira e participação de um monte de gente boa. Segue o flyer...

...

Acaba de ser divulgada a lista de projetos aprovados pela Lei Rubem Braga 2010. A boa notícia é que dentre os contemplados está o editor chefe dessa bagaça que – apesar da idade – vai bisar outra vez (!) É que foi aprovada a reedição do livro Da Capo – Uma Pequena História da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo. Lançado na dezembrada de 2002 pelo Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, esse pequeno e único histórico de nosso principal grupamento sinfônico estava esgotado faz algum tempo. Breve daremos mais detalhes, convidando a todos para o lançamento.  


sábado, 5 de fevereiro de 2011

FRAGMENTOS DE UM ENSINAMENTO DESCONHECIDO


Você sabe como nasceu a “Jovem Guarda”? Tá legal, não é da minha época também, aliás, o programa surgiu no ano que eu nasci. O papo é o seguinte, assim, uma brasa mora? Catei pra assistir o documentário “Uma Noite Em 67”, que conta algumas peripécias daquele terceiro festival da canção organizado pela TV Record que trouxe Caetano Veloso com “Alegria Alegria”, Gilberto Gil e Os Mutantes com “Domingo no Parque”, Chico Buarque com “Roda Viva” e mais uma cacetada de coisas.

Muita gente pensa, e até defende a idéia em textos acalorados enviados e reencaminhados pela Internet, que a televisão Brasileira é quem faz a opinião do público. Eu pergunto: e se for o contrário? Ou melhor: a verdade é que isso não é bem assim e que essa avenida tortuosa tem mão dupla, e a programação das tevês é tão influenciada pelo público quanto o inverso. Considere o texto que segue:

“As massas não procuram o conhecimento, não o querem, e seus chefes políticos – por interesse - só reforçam essa aversão, esse medo a tudo o que é novo e desconhecido. O estado de escravidão da humanidade tem por fundamento esse medo. (...) Basta observar como vivem as pessoas, suas paixões ou aspirações, em que pensam, do que falam, o que servem e o que adoram. Veja para onde vai o dinheiro da sociedade culta de nossa época, considere o que dita os preços mais altos, para onde vão as multidões mais densas. A humanidade tal qual é atualmente, com os interesses pelos quais vive, não pode esperar outra coisa senão o que tem.”

Ouspensky citando G. em seu livro Fragmentos de um Ensinamento Desconhecido, escrito nas primeiras décadas do século passado.   

Tenho a impressão, que é quase uma certeza, de que as pessoas que fazem textos furibundos contra programas como o Big Brother na verdade querem mesmo é chamar a atenção para si, para suas idéias, mostrar como são machos e donos de suas razões. Na época dos Festivais o Brasil vivia um momento muito peculiar de ditadura e indignação social, era também uma época de alienação, porque, naturalmente, a grande maioria das pessoas são mesmo alienadas, desprezam o conhecimento, mesmo nas camadas mais cultas.

Nos extras do filme sobre 1967 tem uma entrevista com Paulinho Machado de Carvalho, então diretor da Record à época. Disse que seu irmão Tite televisionava os jogos do campeonato paulista de futebol e inventou aquela coisa de mostrar a platéia, hoje tão comum com os seus “Cala Boca Galvão”. Numa dessas foi mostrada a tribuna de honra da Federação Paulista de Futebol e lá estava o então presidente da entidade com uma “senhora” que não era exatamente a que ele deveria estar.   

Deu uma confusão dos diabos... E o distinto, o senhor João Mendonça Falcão, em represália, mandou suspender a transmissão dos jogos deixando no domingão um buraco na programação da tevê. Foi na onda de tapar o buraco da madame que se criou um programa “para a juventude”, porque nessa época as pessoas ainda apreciavam música, comandado por Roberto Carlos com o nome de Jovem Guarda, tirado de uma coluna de Ricardo Amaral e o resto da história todo mundo já sabe.

O que vemos no mundo é exatamente isso: pessoas vestidas de alguma autoridade que para continuarem vivendo como querem, ou em função de interesses muito pessoais de um pequeno grupo, inventam sanções e regras para toda a coletividade que, em sua ignorância, balança a cabeça e muge resignadamente. Isso acontece o tempo todo na política, nos movimentos religiosos, em tudo quanto é lugar. De vez em quando aparece alguém berrando contra a situação, mas geralmente o que essas pessoas querem é legitimação para poder conquistar o direito de fazer a mesma coisa.

Observando o conteúdo dos textos antigos podemos perceber claramente que a humanidade não está “evoluindo” como a maioria acredita. O homem patina sobre as mesmas questões das quais se fala nos textos bíblicos mais antigos, só para citar um exemplo. E, entra ano sai ano, dizer que fulano é herói e sicrano não é, é uma tremenda bobagem. Porque a verdade é que somos todos “bucha de canhão”, inclusive o Bial, o Boninho e, especialmente, o Mané que circula texto revoltadinho pela Internet tentando se passar como Veríssimo.

Dorme bem Brasil, sonhe com os anjinhos!

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

AMIZADE, RESPEITO E FIDELIDADE


E a corrida do Oscar 2011 teve dada a largada com o anúncio dos indicados à premiação mais popular da indústria cinematográfica. As atenções estão voltadas especialmente para os dez concorrentes na categoria de melhor filme. São produções imperdíveis e bastante diferentes entre si, embora todas tenham um pé na discussão de valores morais como amizade, respeito e fidelidade. É coisa de Revolução Francesa e certamente uma crítica a esses tempos bicudos em que tudo se torna relativamente desculpável quando há dinheiro envolvido na jogada.

Os três primeiros que vi da lista foram lá pelo meio do ano passado: “A Origem”, um filme daqueles tão complicados que no final acho que nem o diretor sabia mais o que queria dizer, para mim é o mais fraco do pacote; “A Rede Social”, filme relativamente “cabeça” que discute temas como ética – amigos, amigos: dinheiro à parte - e serve para desvendar um pouco de como o homem atual pensa e constrói seu mundo; “Inverno na Alma” é uma história de arrepiar com interpretação fantástica da jovem Jennifer Lawrence.

Os três maiores concorrentes são filmássos daqueles de não se perder nem por decreto: “Bravura indômita” dos irmãos Cohen, tido como refilmagem do western que deu o Oscar a John Wayne, é uma nova abordagem do romance de Charles Portis e tem um elenco fantástico liderado por Jeff Bridges que sabe fazer um doidão como ninguém. O filme traz também Matt Damon muito longe do papel de galã de filmes de ação e a ótima Hailee Steinfield, cujo personagem - e não o do Federal - inspira o título. É um bangue-bangue que honra a tradição cinematográfica norte-americana.  

“Cisne Negro” é um mergulho na arte da dança e um estudo sobre o fazer artístico, o Oscar de melhor atriz já é dado como certo para Natalie Portman, cuja beleza estonteante e atuação não menos catapulta essa produção a uma esfera diferente de suas concorrentes. O diretor Darren Arenofsky é especialista no chamado “filme de arte” ou “alternativo”, mas - como os irmãos Cohen – vem ganhando o mainstream de uns anos para cá. Cisne Negro é um embate entre a loucura do perfeccionismo técnico e a incendiária liberdade criativa, a busca do indizível e do equilíbrio entre a razão e a fé. Esse filme seria a minha escolha entre os dez. Aliás, tem por aí muito “artista” que precisa meditar bastante sobre essa questão.

Finalmente vem o grande favorito do ano “O Discurso do Rei”. Com doze indicações a produção britânica apoiada em fatos reais traz a dupla Colin Firth e Geoffrey Rush em interpretação afinada - ajudada por um roteiro mordaz, talvez o mais “inteligente” de todos aqui – é simplesmente um filme delicioso. Passa longe, entrementes, de discussões atuais, pertinentes e polêmicas sexuais como em Cisne Negro, A Rede Social e Minhas Mães e Meu Pai. É o chamado “Filme de Oscar”, para quem gosta é um prato cheio, mas  muito mais do que isso: é também sobre amizade e confiança.

Pegando carona nesse tema recorrente vem o lindo Toy Story 3, certamente um azarão enfiado nesse bolo de grandes interpretações humanas. É uma daquelas histórias que nos fazem lembrar dos carrinhos de ferro, bonequinhos de Forte Apache, da inocência, da fantasia e da pureza infantil. É também sobre a aceitação das mudanças e do passar do tempo, que não vamos ser crianças para sempre, mas podemos e devemos ser fiéis aos nossos valores infantis. Foi dos dez o filme que mais me emocionou, lembrei  muito de quando resolvi que “já estava grande” e deitei fora todos os meus brinquedos. É preciso dizer adeus às coisas com o tempo, mas nem sempre estamos verdadeiramente prontos para essa despedida.

Três dramas “verídicos” e um nem tanto concorrem a melhor filme e destes o que mais me surpreendeu foi o chamado “127 horas”. Estrelada pelo, até então, lamentável canastrão James Franco a história guarda semelhanças com o também atual e claustrofóbico “Enterrado Vivo”, é, porém, bem melhor realizada e, como já disse, a interpretação de Franco é no mínimo surpreendente para um ator sem carisma que até hoje posou de galã em filmes com e sem a menor relevância para a sétima arte. É uma história que surpreende, emociona e nos faz pensar nos perigos da auto-confiança.

Confesso que acabei dormindo quando fui assistir a “O Vencedor”, mas isso não quer dizer nada, o mesmo aconteceu com “Bravura Indômita” e depois acabei adorando o filme. O show fica por conta do atual “Batman”, Christian Bale que concorre ao Oscar de melhor ator coadjuvante em uma história do peso médio de boxe “Irish Micky Ward” interpretado por Mark Wahlberg. Já "Minhas Mães e Meu Pai" anda sendo anunciado como comédia e é um puta drama que escancara o universo complexo das relações familiares e que o fator homossexual é apenas mais um - e não o principal complicador - dentro desse caldeirão de respeito, fidelidade e união. Vale especialmente pela ótima atuação de Annette Bening. 

Não torço por nenhum concorrente ao Oscar, reconheço apenas a qualidade dos filmes, a importância e a referência da premiação cujos (cujos?) vencedores serão anunciados num festão arrumado no dia 27 de fevereiro. E falando no inverso, não se incomodem em ver bobagens como “Caça as Bruxas”, acho impressionante a capacidade que Nicholas Cage tem de alternar bons filmes com verdadeiras porcarias. Mas, se quiser se emocionar dê uma chance ao deslumbrante “A Viagem do Peregrino da Alvorada”, terceira parte das Crônicas de Narnia. Infinitamente melhor do que o primeiro, a franquia Nárnia fez o caminho inverso dos filmes divididos em sequências, melhorando a história a cada nova produção.