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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

NA DÚVIDA NÃO ULTRA-PASSE ADIANTE

O filme A Dúvida concorreu ao Oscar graças às atuações firmes e convincentes de Phillip Seymour e Meryl Streep (e da "freirinha" Amy Adams), mas o que realmente chama a atenção nessa produção é a qualidade do roteiro adaptado para a linguagem cinematográfica, uma abordagem densa e inusitada dos estragos que podem ser feitos por meias-verdades, fofocas.


Enquanto escrevo isso, circula pela net - como penas de ganso ao vento – um texto em PDF com o título: “O Esquema do Judiciário Capixaba”. E com o pretensioso subtítulo: “O que é preciso conhecer para entender”. O termo “conhecer”, não é o mais adequado para a situação, porque quer ter, na verdade, o sentido de “saber”. O autor quis dizer e realmente escreve, cinco páginas sobre: O que é preciso saber sobre o esquema do judiciário capixaba.


Pra começar, as pessoas sensatas costumam dar crédito, acreditar, em coisas ditas por alguém que tenha alguma credibilidade. O problema é que em nosso meio as pessoas sensatas não são lá tantas assim. E essa carta vem de quem? Ninguém sabe, ninguém viu. Parece coisa de menininha futriqueira, escrita por uma pessoa que não se identifica em momento algum. O texto é endereçado - em formato verborrágico - à Ministra Laurita Hilário Vaz do Superior Tribunal de Justiça, relatora do processo de investigação da Polícia Federal denominado Operação Naufrágio.


Daí a curiosidade me obrigou a assistir o filme “Quem Quer Ser um Milionário?” O grande vencedor do Oscar 2009. É bom, mas muito aquém de produções como O Leitor, O Lutador e A Dúvida. Empataria, talvez, com A Troca, pelo exagero nos clichês, por teimar em construir personagens esteriotipados, onde o bom é ótimo e o mau o demônio encarnado. Lembrou, aliás, o apelativo O Caçador de Pipas e também vem sendo comparado ao ótimo Cidade de Deus. Eu não vi muita semelhança com o filme do Meirelles, aliás, outro injustiçado da Academia.


A Dúvida é um embate entre as suspeitas e a inocência, entre a verdade que nem sempre consegue sanar uma onda violenta de fofocas. As pessoas querem ver sangue! Você acha que não? Assista então ao documentário Ônibus 174, mas faça isso antes de ver a produção de Bruno Barreto. As pessoas gritavam pra polícia linchar o assaltante... Lincha, lincha! E foi o que eles fizeram. É duro ouvir alguns comentários feitos ao longo daquela triste história, de como construímos nossas próprias tragédias relegando seres-humanos à condição de lixo e que essas pessoas sonham, amam e também querem ser felizes e que sem educação, sem rumo, acabam fazendo uma grande besteira.


A carta pra Ministra é assim também: uma saraivada de histórias que eu-sei-lá se são verdade. Não sei. Não conheço essas pessoas. Que diferença faz pra mim - e principalmente para esse processo investigatório - se o Dr. Fulano tem uma amante que tem um escritório de advocacia de frente para o mar e que lá é ponto de encontro de juízes e desembargadores e que a moça se formou há apenas um ano? Isso é fofoquinha de madame saca? Conversinha entreouvida em salão de belezas ou na praçinha de alimentação do Centro da Praia. E como elas são bem recebidas e espalhadas aos quatro cantos...


“A dúvida pode ser um elo tão poderoso e sustentável quanto a certeza.” Padre Flynn – A Dúvida.


A primeira vez que ouvi falar dessa carta foi no Moquecada, a turma estava decepcionada com o “muso” deles – o atual colunista social de A Gazeta - acusado de envolvimento até o pescoço no esquema, o engraçado era os demais leitores implorando pra ler a carta também. Como já disse, esse tipo de “informação” gera sempre muito interesse. Se tem algo de verdade ou não é mero detalhe, todos querem ver os mais sórdidos defeitos dos ricos e famosos espalhados aos quatros ventos. Deveriam ler mais Nelson Rodrigues, pelo menos é ficção de melhor qualidade. Aliás, para quem não sabe, o "anjo pornográfico" foi testemunha do assassinado do próprio irmão dentro da redação do jornal em que trabalhavam por uma mulher ofendida com uma nota publicada sobre o seu divórcio. E ela foi absolvida tá? Defesa da honra ou sei-lá-mais-o-quê...


Falando então em notas de jornais, morte brutal e outras coisas: em minha próxima postagem vou entrar no assunto que realmente quero abordar sobre essa carta: os 20 anos do assassinato da colunista Maria Nilce.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

A GINECOLOGIA DA MORAL

Nunca consegui entender o carnaval. Já pesquisei, li sobre o assunto, conversei com entendidos - que são a maioria- e fiquei na mesma, mas isso não me impediu de aprontar em alguns...

Já fui até confundido pela imprensa com Aécio Neves desfilando lá em São João Del Rey. Claro que isso tem mais de vinte anos, a maioria das minhas recordações carnavalescas tem...

Mas para comemorar na escrita estou eu aqui em pleno sábado de carnaval, de manhã, matutando e mudando o visual da Letra Elektrônica como se fosse fazer muita diferença pro resto do mundo.

Sabe o que é bom no Carnaval? Vitória. Poder andar pela cidade com tranquilidade, não tem quase ninguém. A coisa assenta e a gente pode até pegar uma praiana com tranquilidade na Ilha do Boi.

Falando nisso, acho que vou pra lá. Mad Max quer soltar pipas no final de Camburi e até que o programa me soou interessante, porque inusitado, já é bem melhor do que o trivial...

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

PROPINÁCIO SOLIDÁRIO E O FIM DA FEIRA

O texto sobre a Feira dos Municípios levantou a poeira da memória da galera, trazendo à tona dragões e serpentes voadoras e, obviamente, gerando comentários muito interessantes e esclarecedores, como o de Flavinho "Bell" Salles, que segue abaixo:

"Essa crônica fez um resgate à memória de um tempo mágico - sem “balão azul” nem nada. Realmente, a Feira dos Municípios era um evento muito aguardado e que sempre contava com o comparecimento em massa da população capixaba ávida pelas novidades que a Feira trazia ano após ano.

Outras barracas disputadas eram a de Santa Teresa, com seu vinho de jabuticaba e a da Itália, com suas massas e músicas típicas. (La Lettera Elecktronique: Disso eu me lembro vagamente, tinha barracas de outros países também...)

Mas só pra dar uma informação: em 1999, o Governo José Inácio (ou Propinácio como ficou mais conhecido) decidiu dar um tiro na testa do evento realizando duas edições - alterando inclusive seu nome para Feira da Solidariedade - que aconteceram na Praça do Papa e foram um verdadeiro desastre, existindo até hoje débitos da FAS - presidida pela então primeira-dama Maria Helena Ferreira – a qual dispensa comentários - para com fornecedores de montagens de estruturas, consultores, fornecedores e bandas que se apresentaram. Tragédia, muita tragédia... Até o vento levou os restaurantes e barracas da feira... menos o ouro dos reis do ES."

Flavio Salles

Os editores do concorrido blog Moquecada mandaram um recado lembrando que Albuíno multiplicou sua fortuna promovendo a Feira e que estão torcendo preu ganhar logo na loteria e montar o meu Parque de Diversões – onde não haverá rodeios -, mas que eles (ou elas, sei lá) querem ser "Vips”. Huauhauhauha.

A Fotógrafa Samira Gasparini contou que tem uma foto de sua infância junto com várias crianças representando diversos países na Feira dos Municípios. Disse que sua professora a colocou pra representar o Japão porque achava que seu nome “Samira” fosse oriental.

Então? Você que está aí lendo esse blog, manda sua história pra cá também cara. Demorou. Vamos tentar resgatar alguma coisa desse nosso passado nebuloso. Quem sabe a gente não consegue construir um futuro melhor para esses curumins botocudos que teimam em brotar de nessa terra?

domingo, 15 de fevereiro de 2009

A TERRA FIRME DO PASSADO DISTANTE

Estava falando outro dia - com amigos das antigas e pessoas que teimam em compartilhar recordações - da danada da Feira dos Municípios. Hoje saí atrás de maiores informações no Google e não encontrei absolutamente nada, nem uma foto, uma reportagenzinha de época, nenhum saudosista a fim de contar suas prosopopéias do glorioso passado que a mim não condena. Não sei vocês, mas eu tenho o costume de dar um polimento em muitas das minhas lembranças, algumas nem são tão especiais assim... Eu sei lá por que.

O frisson da Feira dos Municípios entre a garotada é que na parada tinha parque de diversões, uma coisa sazonal na cidade de Vitória que até hoje ainda não tem um fixo como o Hopi Hari, O Tivoli, ou o Play Center. Nunca gostei de jogar, mas quando me perguntavam o que faria se ganhasse na loteria costumava dizer – para surpresa da galera - que investiria em um grande parque de diversões para nossa cidade, apesar de saber que essas coisas por aqui não costumam dar muito certo. Mas faria, nem que fosse pra perder dinheiro vendo as crianças de minha cidade se divertindo...

Pois não encontrei nenhuma informação sobre a Feira dos Municípios na Internet. Cara, até o meu livrinho da orquestra – de tiragem pequena e nenhuma divulgação - eu já achei vendendo em sebo online, como é que ninguém parou pra lembrar da Feira dos Municípios? Será que é porque ela representa um passado rastaquera que todo mundo botocudo preferiu esquecer? Aliás, já imaginou o nosso governador - tão cioso de sua mudernidade cosmopolita - inaugurando a Feira dos Municípios do século XXI?

As mais remotas lembranças que tenho da Feira dos Municípios vêm dos anos setenta quando ela ficava instalada no estacionamento do Clube Álvares Cabral, eu pensava que lá tinha sido o primeiro lugar, mas já ouvi dizer de edições anteriores. Lembro daquelas barraquinhas toscas de madeira com suas comidas típicas em exposição – mamãe sempre me fazia comprar pra ela uma tal de “carne de sol” – a barraca da Serra era a mais animada, um verdadeiro furdúncio acontecia por lá, de longe se via as pessoas doidonas, suas cantorias e a poeira subindo.

Nessa edição da Feira no Álvares o Exército instalou uma torre pra simular o salto de pára-quedas. Fiquei doido quando vi aquela geringonça de metal e as pessoas se balançando nas alturas escorregando penduradas em um cabo até bater no chão sem se machucar. Eu e meu amigo Toninho subimos as escadas às carreiras e, mais ou menos como acontecia com o tobogã, quando fomos chegando ao alto o medo bateu e com ele o desejo de voltar pra segurança da terra firme. Mas éramos valentes e, pra ajudar, não éramos os primeiros. Acreditem ou não tinha até fila pra se jogar da altura aproximada de um prédio de uns quatro ou cinco andares.

Os “instrutores” daquela tarde eram os “recos”, soldados rasos que serviam o Exército por obrigação e, provavelmente estavam deliciados por apavorar pirralhos, se divertiam em atirar os mais medrosos para a liberdade do espaço infinito. Curiosos soldados que auto-afirmam sua valentia a partir da capacidade de incutir medo, assim também são os piores policiais e os bandidos. Depois se aborrecem quando a população demonstra mais desconfiança do que respeito ao se deparar com suas belicosas figuras.

A plataforma de lançamento era ampla, se bem me recordo dava pra lançar quatro pessoas de cada vez, era preciso vestir uma amarração de segurança, realmente semelhante à do pára-quedas do Exército, ligada ao cabo principal que descia até o chão. Meu colega medrou. O soldado terminou de me atar ao equipamento e foi ajudar seu companheiro a jogar meu amigo lá de cima. Pude então olhar pra baixo e minhas pernas tremeram. Hesitei. Toninho desceu gritando que nem um doido, os soldados se voltaram para mim lendo o terror em meus olhos, entreolharam-se divertidos.

Olhei para eles, olhei para o chão e me atirei amalucadamente. Um coturno que me pareceu enorme passou no vazio, bem às minhas costas que, junto com meu corpo, já acelerava em direção ao solo. Quando vi estava do outro lado da feira, um soldado rapidamente me desprendeu do equipamento, minhas pernas tremiam de emoção. Eu tinha sobrevivido à aventura! Na saída ainda ganhei um diploma que exibia orgulhosamente à todos e do qual não faço a menor idéia do paradeiro.

Os anos passavam e as Feiras aconteciam, curiosamente sempre atraindo muitas chuvas. Para nossa tristeza o mesmo problema se dava com os deliciosos piqueniques de fim de ano do Colégio Sacre-cour. Mudavam a data da Feira de novembro pra agosto e outros meses, mas não tinha jeito. Sempre caía uma tromba d’água, especialmente na noite de abertura, a ponto de virar tradição e dar gênese a piadas do tipo: hoje não tem Feira dos Municípios, mas chove na cidade.

Lembro da Feira dos Municípios acontecendo também no Campo do Caxias na Avenida Maruípe, uma vez levei meu primo Felipe lá pra conhecer o parque de diversões e depois do Rotor o menino botou os bofes pra fora. Mas uma das maiores atrações da Feira era mesmo o Tobogã, isso, obviamente, quando não tinha Montanha Russa. Era divertidíssimo tanto descer escorregando a mil por hora quanto ficar lá em baixo vendo os outros se espatifarem num festival infinito de trombadas, rasteiras e tabacos espetaculares. Tinha também os carrinhos de bate-bate e a inesquecível, porque impagável, Conga a Mulher Gorila.

Muita gente ia à Feira dos Municípios por causa dos shows, que se não me engano, começaram a rolar em suas edições mais modernas. Após

me passarem as espinhas, deixei de freqüentar o mais querido evento botocudo, só ia lá tocar com o Pó de Anjo, em meados dos anos oitenta, quando a parada acontecia em uma área próxima ao bairro Jardim Camburi. Depois mudaram a feira para o parque de exposições de Carapina, como se antecipassem o Vital, sim, porque o evento era também um transtorno para os moradores do bairro vizinho... Pelo menos era 100% capixaba.

Hoje a Feira acabou. Não sei dizer quando e qual governo decretou seu fim, mas sou capaz de dizer que durou por duas décadas ou mais. Não me peça pra dizer se ela deveria voltar, porque sei que – por exemplo- a Praia do Canto nunca mais voltará a ser a mesma. Ficam as lembranças singelas, Alice está me dizendo que foi numa Feira dos Municípios que ela comeu “maçã do amor” pela primeira vez. E foi lá que eu aprendi a voar, agora ela me rebocou de novo pra longe, lá pra terra firme do passado distante. Espero que também desperte em vocês memórias felizes e que juntos possamos compartilhá-las, como irmãozinhos capixabas que somos...

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Alô, alô Geração Coca-cola, Filhotes da Ditadura, Rebentos da Década Perdida!

Tô escrevendo só pra dar a boa notícia de que meu primeiro romance - o “Livro do Pó” – acaba de ser aprovado pela Lei Rubem Braga. Foram alguns anos de idas e vindas tentando editar essa obra através de concursos e outros mecanismos culturais e agora que passou mais essa etapa temos que comemorar. Tá certo que cortaram o orçamento proposto em mais da metade, o que me obrigará a reduzir padrões de qualidade gráfica e contar com o apoio dos colegas de plantão para idéias criativas, especialmente no que diz respeito à festa de lançamento.

Para aqueles que estão me lendo e não têm a menor obrigação de saber, mas que se divertem com meus textos e acham o meu pianismo interessante: O Livro do Pó é uma história passada na cidade de Vitória - capital do Espírito Santo - nos anos oitenta, livremente inspirada na trajetória da primeira banda de pop rock local - o Pó de Anjo - da qual fui vocalista e principal compositor. No livro tem em detalhes tudo o que a geração Coca-cola viveu e como a juventude botocuda se virava pra coisar no período liberou geral da pós-ditadura.

É bom explicar que, apesar de ter vivido intensamente essa história, para respeitar a cronologia de certos fatos foi preciso pesquisar em jornais e vídeos antigos. Nossa memória nos engana, dentro dela distorcemos lembranças, embolamos pessoas, trocamos eventos, esquecemos nomes, enfim, não podemos confiar nela. Por isso precisamos de obras como essa: que mergulham no fundo do rio do passado e trazem de volta aqueles fatos corroídos pelo tempo. Através da reflexão sobre o que se passou podemos aprender muito e, consequentemente, ensinar e compartilhar essa experiência com os que estão chegando.

Tive boas razões para me afastar da música profissional, entre estas, o assassinato de minha mãe – a jornalista Maria Nilce Magalhães, morta em julho de 1989 – fato que virou minha vida pelo avesso e que me proporcionou um longo período de reflexão, trabalho e estudo, mas que não me permitiu exercer do ócio criativo filosofante. Nunca havia cogitado a idéia de escrever um livro, nem atuar como “blogueiro”, ou outro elemento qualquer da comunicação, talvez porque negasse esse meu legado e a posição no mundo que ele me reservou.

Mas então veio a revolução informática, o pc e a internet. Frequentemente me pegava entediado em lugares “de trabalho” - onde muito se espera e pouco se produz - e o computador estava ali, muitas vezes como única companhia. Comecei a escrever para espanar o tédio de existir, como um prisioneiro em minha cela, átomo, célula, mundo. Obviamente o início dessa experiência foi esporádico e desorganizado, escrevia dois capítulos e ficava quatro anos sem olhar pro texto novamente. Até que, há uns cinco anos, peguei o touro pelo chifre e levei a história até o fim.

Vieram então os anos de luta para publicar, o que acabou sendo muito bom, porque me deu tempo para repensar fatos, julgar o papel de alguns personagens e também enxugar o texto unificando sua linguagem. Se a hora dele é essa, é porque essa é a hora boa. Quero mencionar o apoio que tive dos amigos Leonardo Monjardim e Leandro Haddad, pelo aconselhamento e incentivo sem os quais eu nem teria dado entrada nesse projeto. Breve estaremos tomando uma cerveja no lançamento da parada, ou champagne, ou água – como le gusta – ao som do bom e velho roquenrou, todos serão devidamente convidados.
Não é nada, não é nada, mas uma hora a gente coisa!