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domingo, 27 de julho de 2014

O TEMPO E A MÚSICA DO MEU TEMPO...



Vitorinha dos anos oitenta, ilha maluca de gente metida a muderna. Fim da ditadura, morte de Tancredo e a besta do Sarney que virou presidente. Bom, nem sei se o Sarney era mesmo uma besta, mas na época eu achava. De besta aquele cara não deve ter é nada. Besta somos nós, especialmente bestas éramos naquele tempo.

Eu respirava os ares de uma cidade que não existe mais, porque o tempo passou. As ruas e esquinas, os meninos e as meninas, uma incerta vida mansa. Eu queria ser tudo, achava que podia tudo, tentava engolir o mundo e acordava de ressaca, muitas vezes sem saber como tinha chegado, onde estava, ou quem era a garota do meu lado.

Sobrevivemos, aliás, muitas vezes tenho a impressão que somos sobreviventes. Porque pessoas vão ficando pelo caminho e aí descobrimos que a festa estava acabando, aliás, naquela época Renato Russo disse que “o pra sempre, sempre acaba” e eu não concordava, achava o cantor da Legião um cara meio besta também.

Eu queria alcançar o tempo, ultrapassar minha sombra, amarrar o burro, mas meu próprio querer atrapalhava. Saía para vagar de noite atrás de uma determinada paquera específica e acabava passando o rodo noutra que tinha, aliás, um provérbio muito citado era: “se não tem tu, vai tu mesmo”.

A cabeça era povoada de ilusões, grandes e pequenas, abismos e confusões; o bom era “ducaralho”, o ruim uma “putamerda”. Detestava competição, achava que algo tinha que ser meu por merecimento ou destino e que se pudesse ser de outro não merecia o trabalho. Talvez fosse medo de perder, de falhar, daí perdia até sem disputar.

Com o tempo entendi umas coisas, outras acho que jamais deve rolar: as pessoas que se vão em vida, a crença religiosa em coisas materiais, o mundo real que, aliás, não sei mais se existe de verdade. Contatei que a mentira tem pernas curtas e que muitas vezes nos ajuda, o que atrapalha é persistir no erro.

Falando naquilo, um dia aprendi que só a persistência e a disciplina nos levam a algum lugar sólido e nos liberta da imaginação do que podia ser, mas... Depois de muito matutar saquei que desenvolver habilidade leva tempo, descobri também que ninguém nasceu sabendo nada e que, por outro lado, certas coisas não se aprendem.

Eu não podia andava e tentei voar... Eu sei, foi John Lennon quem disse isso. Talvez estivesse fazendo um balanço de expectativas como o que faço agora. Seguindo o pensamento musical, hoje de manhã estava no banho e lembrando os discos que mais marcaram minha infância e pré-adolescência, uma lista “top dez” com quase vinte:

1.      Sweet “Sweet Fanny Adams” (1974)

Acho que foi o disco que mais ouvi na infância, era rock glam ou glitter, meio farofa, mas as músicas e os músicos eram muito bons. Os caras passam a impressão de que podiam fazer muito mais do que estavam fazendo e que, o mais legal de tudo, aquilo era apenas uma baita diversão.

 
2.      Rita Lee “Fruto Proibido” (1975)

Tenho saudade dos ares que a gente respirava ao ouvir esse disco, aquela bateria datada, pra mim é o melhor dos anos setenta.
 


3.      Bob Dylan “Desire” (1976)

Sempre adorei aquela pegada folk da canção Hurricane, é engraçado pensar que a gente não sabia da grande sacanagem que o Bob denunciava na letra.

 
4.      Milton Nascimento e Lô Borges “Clube da Esquina” (1972)

Esse é pra ouvir da janela lateral do quarto de dormir... Acho que é o disco brasileiro que mais me influenciou.


5.      Deep Purple “Stormbringer” (1974)

Como no caso do Black Sabath e do Led Zeppelin, não é o disco mais famoso da banda, mas é o que tinha lá em casa, fui abduzido pela osmose musical dos caras.

 
6.      Led Zeppelin “Physical Graffiti” (1975)

Eu viajava naquela capa com as janelinhas, lembro do disco ficando velho, da capa rasgando...

 
7.      Genesis “Selling England By The Pound” (1973)

Tinha uma propaganda na televisão com uma galera andando numa cachoeira e entrava o piano com Peter Gabriel cantando citizens of hope & glory time goes by - it's 'the time of your life... Por essas e por outras o piano é meu instrumento favorito.

 
8.      The Rolling Stones “30 Greatest Hits” (1976)

É uma panorâmica muito boa dos Stones e eu ouvi bagarái, a música que mais ficou na minha cabeça desse disco, sei-lá-por-que, é Dandelion, que me remetia a uma parada meio misteriosa. Not Fade Away eu toco até hoje, inclusive em rodas de violão, depois fui descobrir que era um cover do Buddy Holly.

 
9.      The Beatles “Album Azul 1967-1970” (1973)

Duas coisas marcaram profundamente minha infância e adolescência e eu as absorvi à exaustão: a música dos Beatles e as revistas do Asterix. Chegou uma hora que enjoei: parei de ouvir, de tocar e de ler. Agora, chegando perto dos cinquentinha, me deu a doida de reler tudo do Asterix e estou me esbaldando de novo com o humor deles.
 


10.  Black Sabbath “Technical Ecstasy” (1976)

É o disco do Sabbath que eu gosto, os outros, alguns muito mais famosos, não me fizeram tanto a cabeça.


11.  Billy Joel “The Stranger” (1977)

Uma coisa que eu adoro na música dos anos setenta é a forma de compor grandes canções, com mudanças de andamento, de clima, como é o caso de Scenes From an Italian Restaurant e a maioria das canções desse outro disco que vem abaixo.


 12.  Supertramp “Crime Of The Century” (1974)

Agora a gente tá falando de piano. Esses dias eu peguei um show do Supertramp pra ver e estava reparando que nunca, mas nunca mesmo, eles fazem um slide, o tal do “glissando”. Saca? Aquela compulsão irresistível de escorregar os dedos pelas teclas? Rick Davies não cai nessa, o cara é o melhor pianista do Rock’n’Roll...

 
13.  The Who “Tommy” (1975)

Pode parecer incrível, mas nessa época o Fantástico já existia, só que era com Cid Moreira e aquela voz de além túmbalo e passou um videoclipe do Elton John tocando Pinball Wizzard. Pirei geral e mandei logo um daqueles “pai compra esse disco pra mim!?” Acho, aliás, que foi o primeiro disco que ganhei...

 
14.  Primeira Trilha Sonora “O Sítio do Pica Pau Amarelo” (1977)

As canções são tão boas que, curioso, nunca tive coragem de tocar. Também, quem é que consegue reproduzir aquele violão do João Bosco na música do Visconde? Adoro muito aquela música que fala assim “Pêxe! Dêxeu te ver pêxe!” Suspeito hoje que fosse pura viagem de maconha, bem no estilo dos anos setenta...

 
15.  Trilha sonora do filme “Embalos de Sábado a Noite” (1977)

Quando ameacei entrar na adolescência explodiu a onda Disco, então rolava Donna Summer, Village People, Santa Esmeralda (credo!) e canções como “Love is in the air” e “I Will Survive”. Lembro de uma música meio pesada chamada Like a Locomotion que tocava muito nas noitadas do Clube Centenário que era perto de nossa casa. Mas de todos o filme Saturday Night Fever e sua trilha sonora mais-vendida-de-todos-os-tempos foi o que morou de aluguel nos nossos ouvidos por mais tempo.

 
16.  Caetano e Chico Juntos e Ao Vivo (1972)

Chico Buarque e Milton Nascimento eram os “artistas” preferidos de mamãe. Pelo menos são os dois que mais me lembro dela cantando e ouvindo. Papai gostava muito dos Demônios da Garoa, mas não lembro qual disco tinha lá em casa. O velho comprava fita cassete também, tinha uma dos Demônios que a gente ouvia indo para a praia em Manguinhos. Aquela música da “laranja madura na beira da estrada” eu achava que os caras cantavam “capixaba Zé contém maribondo no pé”.

 
17.  Simon And Garfunkel’s Greatest Hits (1972)

No ano passado caiu no meu colo a partitura de uma transcrição fiel, portanto difícil, do arranjo para piano de Bridge Over Troubled Water. Toquei, mal e porcamente, admito, numa apresentação do Algazarra. O Concerto no Central Park é imperdível também, um tempo atrás descobri que foi filmado e pirei o cabeção...

 
Lembro de muitos outros discos que não conseguiria identificar exatamente, mas que não me marcaram tanto assim, tipo o “Frampton Comes Alive” ou os inevitáveis do “Rei” Roberto Carlos. Tinha um álbum duplo de sucessos do início do Rock’n’Roll com Rock Around The Clock do Bill Halley e outras do Elvis, The Everly Brothers, The Platters, Little Richards, Chuck Berry e mais um monte.

 
É como se eu pudesse ver agora alguns discos da coleção “Os Clássicos Mais Populares do Mundo”, com uns gatinhos na capa, que papai ouvia super compenetrado olhando para o nada. Ele gostava muito também de música “romântica”, especialmente francesa (Piaf e Charles Aznavour) e italiana (Ornella Vanoni). Rolava muito aquela música “Love Is All” o cara tinha uma voz de tenor rasgadássa que todo mundo achava foda. Mas foda mesmo, camarada, era ter que escutar. E Zé fini!

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