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terça-feira, 7 de abril de 2009

BOA NOITE SEU JUCA

Lembro direitinho da primeira que vez que alguém me chamou de “rapaz”. Eu devia ter treze pra quatorze anos e era um moleque espichado, estava comprando um refrigerante numa lanchonete qualquer no centro de Vitória, daí a mulher que me atendeu virou-se para um menino que trabalhava com ela e falou:

- Pega lá o refrigerante pro rapaz. – Me deu um orgulho danado por dentro, era a primeira vez que não me tratavam sumariamente como criança. Minha mãe sabia dessa minha vontade de ser adulto logo e sempre me recitava seus poemas prediletos, especialmente um que falava em prolongar ao máximo o tempo de criança e coisa e tal, não lembro direito como era...

Agora me surpreende por dentro, em razão inversa e proporcional - ando matemático ultimamente - a quantidade de vezes que tenho sido tratado de “O Senhor”, e ainda mais do que isto: me assusta a naturalidade com que isso tem acontecido. Nunca me quis, nem me imaginei, um “senhor” respeitável, mas cara: não é que aconteceu? Entro no elevador segurando o riso - especialmente se estou acompanhado - quando o porteiro me deseja uma “boa noite Seu Juca”.

Como assim “Seu Juca”? Esse “Juca” é o meu apelido queridíssimo de infância, grudou - como diria Alzinete - “ni mim” e antes que eu entrasse na adolescência já tinha ocupado o lugar do meu sonoro nome, não poderia jamais vir precedido por esse “Seu”. É como encontrar os Trapalhões e chamar o Renato Aragão de “Seu Didi”. Esse apelido pressupõe familiaridade, conhecimento, intimidade... Mas a culpa é minha mesmo, talvez devesse ter continuado usando o Juarez que herdei de meu pai. Jucarez = Juca.

A idade mesmo não me incomoda. O que assusta é sentir esse deslocamento sutil para um outro grupo de pessoas, aquele tão distante faz, parece, tão pouco tempo. Sinto-me como se fosse de uma tribo de doidões e de repente tivesse entrado pra polícia. Não sou mais um como todos, sinto-me impuro e respeitável como uma bomba atômica, objeto de reverência e alienação de todo o resto, totem cravado no pátio da aldeia. Presença distante.

Muito desse processo social de envelhecimento incomoda as pessoas pelo viés da vaidade, o que não é certamente o meu caso. Sinto esse movimento como um fenômeno do inconsciente coletivo mais do que físico, porque não tenho idade para ser classificado como velho... Ainda não. O que me acontece é o estupor de entrar com tudo nessa fase madura da vida e me dar conta disso através dos olhos e da voz das pessoas do mundo, descobrir que me mudaram de categoria sem ao menos me consultar.

Pronto Seu Juca, agora o senhor é “sênior”, bem vindo ao maravilhoso mundo das perguntas sádicas e indiscretas: o senhor já sabe que na sua idade é preciso fazer exame da próstata não é? Tem certeza que o senhor não tem problemas de ereção e ejaculação precoce? - e falando amigavelmente de minha mulher - Essa aí é sua filha?

2 comentários:

Maria Paula disse...

Juca, essa foi fabulosa!!! kkkkkk

Essa história de Seu, Dona, Senhora... Eu ainda não me encaixei nesse perfil, meu caro amigo, mas o perfil já está encaixado em mim!!!!

Ninguém merece se sentir fora do contexto cronológico da idade, porém, até agora eu me sinto (será alguma síndrome de Sininho, de Cinderela com Wendy???)

Vou pro analista!!

Beijos mill!!!

P.S.: Vou divulgar seu último post no boneca de pano, pois vale a pena, posso?

Unknown disse...

Amigo Juquinha, agora vc deve entender o pq eu te chamo assim, né, véio? rsrs. Bom, quero te dizer que esta história de "seu", "senhor", e outras pornografias, não foram feitas para nós. Eu, por exemple, me recuso a deixar de ser jovem. Não gosto de ser chamado desses palavrõs que nos lançam, tresloucadamente, sem nosso consentimento, no campos dos "já passados pela vida". Agora imagine vc a cara que faço quando estou com algum sobrinho no colo e um imbecil qualquer pergunta: "é seu neto?". Tenho duas resposta para ele: 1 - (externa) Não, ainda não tenho idade para ter netos;e, 2 - (interna) Seu *&¨$%#@, só se fosse com sua *%)*&¨)@&*¨%%%. rsrsrs

Abraços, fio.