Soube agora do falecimento, aos 95 anos, da pianista Edith Bulhões,
militante antiga da música de concerto no Espírito Santo. Quando pesquisei a
história da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo, encontrei o programa de um
recital de Dona Edith em Buenos Aires, certamente o auge de sua carreira como
concertista internacional.
Durante a pesquisa descobri
também que Edith estava envolvida numa questão relativa ao nome da Orquestra dos Capixabas criando uma situação que permanece até os dias atuais. Tudo bem que talvez fique até estranho o grupo mudar outra vez de nome agora, quase vinte anos depois, mas leiam a seguir um trecho do livro Da Capo –
De Volta às Origens Da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo, para entender melhor a questão:
Com a aprovação do quadro
complementar de cargos e salários em 1986, a Orquestra que já fora de Câmara, Clássica e Filarmônica mudou
de nome pela quarta vez e passou a ser definitivamente intitulada “Sinfônica”. Definitivamente? Essa era,
na verdade, a denominação adequada para o grupo, porque, nem todo mundo sabe,
mas o que distingue uma Sinfônica de uma Filarmônica não é o número de seus
integrantes, nem o repertório que executa e sim a sua condição formal. As
Sinfônicas são órgãos governamentais custeados pelo Estado (leia-se pelo povo).
As Filarmônicas, o nome já diz, são em tese (porque a OFES tem o nome de
Filarmônica e não se encaixa na descrição) sustentadas por doações filantrópicas,
por “amigos da música”. A denominação
não significa que uma Orquestra esteja em um patamar inferior com relação à
outra, as Filarmônicas são órgãos privados, muitas vezes de um poderio enorme.
Talvez a mais rica, tradicional e respeitada Orquestra do mundo seja a
Filarmônica de Berlin.
Mas então porque a OFES é
Filarmônica e não Sinfônica se o grupo sempre teve gestão e custeio do Governo
do Espírito Santo? A explicação é meio torta: muito antes da criação da OFES
(na década de sessenta!) uma pianista e promotora cultural chamada Edith
Bulhões fundou e registrou em seu nome uma “Orquestra
Sinfônica do Espírito Santo”. Embora quase ninguém mais se recorde, Dona
Edith chegou a realizar apresentações com o grupo, como atesta uma reportagem
do jornal A Tribuna de 04 de setembro de 1975, cuja manchete, que por sinal
destilava uma certa ironia, era: Nós
temos uma “Sinfônica”. Alguém sabia? Mais abaixo vinha a explicação:
“Quando a Orquestra Sinfônica Brasileira esteve em Vitória, apresentando
o Projeto Aquarius, o maestro Isaac Karabchevsky fez um apelo ao Governador
Élcio Álvares para que fosse criada uma Orquestra semelhante no Espírito santo.
Depois do espetáculo de encerramento da Semana do Exército, Edith Bulhões,
diretora da Sociedade Cultural Artística de Vitória, foi conversar com o
maestro, explicando-lhe que já existia a Orquestra Sinfônica do Espírito Santo,
mas que, por falta de verbas e de músicos ela tinha feito apenas uma
apresentação, no dia 25 de setembro de 1971, como um conjunto de Câmara.
Ninguém até então tinha conhecimento da Orquestra, nem mesmo a Fundação
Cultural do Espírito Santo. A Orquestra Sinfônica do Espírito Santo foi
registrada no Ministério de Educação e Cultura em 1964 e pelo Governo do
estado. Até hoje, ela existia realmente apenas no papel, lavrado pelo órgão
educacional e mantida aos solavancos por esmolas dadas por autoridades e
congressistas, depois de pedidos insistentes da diretoria da SCAV.
Publicado no jornal A Tribuna em 04 de
setembro de 1975.
Como a própria Edith Bulhões explica
na reportagem acima, sua Orquestra nunca chegou a “decolar” de verdade. Portanto não vamos aqui entrar nos méritos
que levaram esta mesma senhora - depois de seis anos de existência da OSES - a
reivindicar em 1992 os direitos sobre o uso do nome da Sinfônica do Estado. Foi
uma atitude polêmica que gerou um processo há muito engavetado no arquivo da
Secretaria de Estado da Cultura. Segundo depoimento do maestro Helder Trefzger,
a discussão não foi em frente para evitar uma celeuma desgastante com uma
pessoa pública de méritos inegáveis para a cultura local. Foi decidido que a
Orquestra simplesmente voltaria a ser denominada Filarmônica, embora não muito
corretamente, e seguiu-se em frente o curso da história.
Um comentário:
Nao sabia desse fato, e como analfabeta de musica, nao entendia a diferenca entre uma Sinfonica e uma Filarmonica, e vc nao imagina como fiquei feliz com a sua explanacao! Vc escreve tao bem que parece que ouco vc falando!
Abracos mill, Mary Paul
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