Em um texto anterior
sobre o bichano mais fotogênico do universo afirmei que o nosso gato, o Simba,
tem hábitos noturnos; passado seis meses descobri que não é bem assim que a parada
funciona. A verdade é que esse sujeito que não ultrapassa a altura das minhas
canelas leva a vida num ritmo diferente dos humanos: tira longas sonecas - seja
de noite ou de dia - e depois brinca de pique esconde (seu predileto), come e
bebe água, faz a toalete ou fica virado no modo “guardião”.
Simba sonhando com a liberdade |
Para conseguir tirar
suas grandes sonecas durante o dia o Simba se esconde no que entende como “modo
invisível”. Seu lugar preferido para desaparecer é dentro do sofá da sala, mas costumamos
encontra-lo debaixo de nossa cama, enfiado dentro do armário ou em algum outro cantinho
escuro e quente. Numa dessas desaparecidas ficou preso por horas numa das
bandas do armário sem que notássemos seu sumiço e, ao invés de miar
desesperado, o bicho dormiu a perder de vista.
Além dos modos já
comentados o Simba tem o chamado “modo evasivo”. Todo e qualquer barulho – o
interfone, a campainha, o liquidificador - é motivo para sair correndo rente ao
chão, como soldados nos filmes de guerra, rastejando para fugir de balas
perdidas, com o rabo em antena e as orelhas apontadas para trás. Esse gatilho
do pânico torna o modo guardião uma coisa curiosa, afinal, o bicho está sempre
pronto para empreender a fuga e não para nos defender de um eventual inimigo.
Falei também de minha
surpresa quando descobri que o gato se comunica, depois constatei que seu poder
de articulação é ainda mais amplo do que eu poderia supor. A princípio notei
que quando estava com fome o Simba nos seguia até a cozinha e miava na direção
do saco de ração. Hoje quando a fome aperta o bicho vai até onde estamos e dana
a chamar atenção, quando paramos o que estamos fazendo ele dá uma espécie de
pinote animado em direção à comida. Só falta gritar: hora do rangooo!
Como vive num universo
diferente dos humanos o nosso sono é uma parada que incomoda o Simba, não dá
nem pra pensar em deixa-lo passar a noite dentro do quarto. No início ele até ensaia
uma dormidinha, mas quando dá a doida começa a pular em cima da gente, “brincar
de morder” ou lamber com sua língua de lixa. Numa dessas acordei com ele em
cima da cabeceira da cama dando lambidas na minha mão e sorrindo para mim. Contei
pra Alice que teve um siricotico de tanto que riu.
Apesar de ter o corpo
recoberto por um sedoso casaco de pele branco rajado de cinza e marrom, nosso
gato é friorento como um baiano, não suporta ficar no ar-condicionado e quando é
posto para correr ainda sai resmungando. Por falar nisso, essa semana fomos surpreendidos
por um baita discurso matinal. Saímos juntos do quarto e o Simba parecia querer
contar alguma coisa muito emocionante que acontecera durante a noite: miau,
miou, miau, miau! Depois danou a ronronar alto como um asmático e se arrastar
nas nossas canelas, gestos mais comuns do repertório felídio que significa: “Me
dá carinho gente! Eu amo vocês!”
O Simba é, portanto,
carinhoso do seu jeito independente de ser, é também ciumento e territorialista
ao extremo. Tem ciúme, por exemplo, do computador e especialmente do piano onde
eu e Alice passamos várias horas sem lhe dar atenção. De vez em quando estamos
totalmente absortos e o bicho vem morder o calcanhar, quando paramos o sem
vergonha dana a virar pra lá e pra cá fazendo gatice. Tenho, inclusive, a
impressão de que seu gosto musical está mais para o clássico do que para o
romântico.
Talvez por falta de
apreço à música de Chopin o Simba não seja muito chegado em agarração e outras demonstrações
de afeto. Também não responde a psiu-psiu, isca-isca e vem cá bichano, seu
negócio é ficar de longe dormindo ou montando guarda. Porém, com o tempo e a
convivência achei uma forma de invocar sua presença. Não me pergunte como
descobri isso, nem sempre dá certo, mas basta assoviar o Tema da Vitória do Ayrton
Senna que o gato vem, muitas vezes resmungando contrariado.
Apesar de aparentar
ser um heterossexual convicto descobrimos que o Simba tem mais ciúme de mim do
que da Alice e também mais do que a própria. Certas noites, quando chego em
casa do trabalho, o gato vem se esgueirando e entra numas de me inspecionar. Cheira
longamente minhas mãos, meus sapatos e minha mochila e se alguma coisa não soa
bem ao seu olfato dana a rosnar e até ameaça morder, mas essa rotina maluca só
foi adotada depois que intermediamos a adoção do Zeus.
Um dia descobri pelo
Facebook que havia um casal de branquíssimos filhotes de gato para adoção.
Compartilhei a postagem e pelo Wattsapp recebi um recado da Letícia: “Tio Juca,
traz esse gatinho para mim aqui em Fundão?” Muito fofa e querida, a filha
caçula de meu primo Everaldo, não havia a menor chance de negar seu pedido, mas
a operação demandava logística e isso incluía um pernoite do Zeus em nossa
casa, ou melhor dizendo, na casa do Simba!
Honestamente, em minha
ingenuidade pensei que o gato fosse se amarrar na visita.
No Próximo post:
GUERRA TERRITORIAL!