O empresário João se intitulava o “Rei do Triângulo”. Na confusão foi
abordado pela Guarda Municipal e afirmou que poderia fazer o que quisesse, já
que é muito rico. “Sou milionário, fazer o quê? Tenho muito dinheiro, muito
mesmo, tenho dinheiro para jogar fora. Sou o rei do triângulo das bermudas, de
tudo, do mundo", disse. João e o filho foram conduzidos para a delegacia
após usarem um carro de luxo para fechar a Rua 24 horas na Praia do Canto, em
Vitória. Após pagarem a fiança de R$ 14 mil, pai e filho acabaram liberados.
TV Vitória
Redação Folha Vitória em 13/10/2014
Qual a graça de ficar
rico “bagaráio” e ninguém saber? Desfrutar da riqueza, certo? Porém, o reles
mortal quando põe a mão na grana quer gozar também da respeitabilidade comum
aos “poderosos”, quer ser tratado como cidadão “vip” e visto como algo –
interna e externamente - muito diferente do povo que se espreme dentro dos
ônibus e vive a reclamar da chuva.
Uma vez em um
restaurante “de ricos” vi um cara
fazendo altas grosserias com o garçom, meu amigo Grilo Falante, que vive de
destrinchar a cabeça dos outros, comentou que aquilo era atitude de quem já
tinha sido pobre e que a proximidade com o passado incomodava. Muita gente é
grossa porque não gosta de lembrar quem é. Ficam piores quando descobrem que o toque
de Midas não muda isso.
A notoriedade de
alguns “famosos” não está ligada diretamente ao dinheiro, mas a certa posição respeitável
dentro de uma comunidade, ao acaso de uma beleza estonteante ou um talento raro
genial inato. Reunir uma fortuna é algo admirável, especialmente quando honestamente,
mas não faz ninguém ser reconhecido na rua. Quem tem dinheiro é porque se
dedicou a ganhar dinheiro, e daí? Não é como vencer um campeonato ou lotar um ginásio
com gente pagando pra cantar suas canções.
Nos anos 1970
falava-se com desprezo dos “novos ricos”, cujo (cujo?) mau gosto e falta de “cultura”
fazia a diversão de quem achava que uma pessoa fina devia saber que o perfume
Patchouli tem propriedades afrodisíacas ou que Fellini era um cineasta italiano
e não um coletivo de gatos. Enquanto os esnobes frequentadores da high sonhavam em viver na ponte-aérea
Paris-Milão, os novos ricos, que o poderiam fazer, organizavam animadas excursões
de pescaria e caça na região do Pantanal.
Quando li a notícia do
barraco que rolou naquele domingo no Triângulo das Bermudas - que o Cocó outro
dia chamou de “Bobódromo” e eu esquecera o apelido, por sinal, bastante
apropriado - lembrei dos “novos ricos” e, ao invés da comum indignação
moralista, tive pena. A atitude biruta do auto-intitulado “Rei do Triângulo”
foi o mais escandaloso exemplo de baixa auto-estima que já vi e olha que
inúmeros outros aparecem de quando em vez.
Ironicamente, como
geralmente acontece, desejando mostrar seus carrões e atrair atenções positivas
como a vergonha alheia - SQN! - o Rei do Triângulo conseguiu exatamente o
inverso e ao pagar caro por isso declarou que a renda não era problema. Ficou
bem claro que não. O problema é “ter” tanto e “ser” tão pouco. É se debater em
praça pública mostrando para todo mundo que, depois de meio século, não fez ainda a descoberta mais
besta da vida: a felicidade reside nas coisas simples e não é o dinheiro que a traz.
Quem dera, ao invés de
promover barracos bobocas, esses enricados carentes resolvessem usar o excesso
de capital acumulado para apoiar algum artista promissor. Infelizmente não vejo
ninguém nessa onda, nem mesmo antigos afortunados. Talvez o contato com pessoas
humildes, porém mais cultas e criativas, traga à lembrança os dias difíceis e
deles apenas queiram distância. Talvez achem errado bancar “a boa vida dos
vagabundos” enquanto deram tanto duro para construir suas fortunas...