“Bebo para tornar as outras pessoas
interessantes.”
George Jean Nathan
George Jean Nathan
O demônio caminhava
sobre a terra. Não seguia intuição, mas algo - como poderia dizer? – mais terráqueo
e predestinado. Tudo existe para cumprir uma função, pensava ele, especialmente
o medo no coração dos homens. Ah! O demônio sabe disso! Entretanto, não é de
seu feitio inculcar pavor em ninguém não. O medo é tão comum quanto o sangue
que circula e a respiração que pode ventilar ou envenenar dependendo do que se
respira.
As fronteiras entre o
medo e a crença em poder o derrotar criaram o círculo vicioso que alimenta a
besta. Quem pensa que o demônio não sabe disso não conhece suas verdadeiras
intenções no mundo, ou suas necessidades. A única coisa que o demo sabe ser preciso
combater é a suspeita de alguns que começam a cogitar a negação de ambos. E tem
como? Ter medo é ter já alguma coisa, perder todas as outras é um perigo que
povoa os ninhos de corvo e os fios de cabelo naqueles que ainda o têm.
O medo corrói a alma por
dentro, cria buracos no coração, prepara o homem para o fim. As pessoas
destemidas são grande diversão para o demônio, porque ele acredita de verdade
que não existe isso e adora ver alguém quebrar a cara tentando provar o
contrário. Ainda assim, o demo reconhece transformações de fúria e
transmutações de tédio. Esse último é parente da descrença, primo da desilusão,
retrato do corpo que foi encontrado na praia, um homem que nadou, nadou e
morreu por lá.
O bicho homem foge do
medo tentando se divertir, muitas vezes coloca medo nos outros, aí do nada vem um
que diz “isso é tudo ilusão”. Diz que todos os castelos eram de areia, os oásis
eram miragem, o anel que tu me destes era vidro e se quebrou. Saber isso não
quer dizer nada, não é novidade, nem segredo de sociedade secreta. É como a
própria vida: uma hora estou dormindo e sonho, outra hora não quero ter medo de
acordar quando não estou dormindo.
“Dijahoje eu disvaziei
as memória do que inhantes era coisa de valor pra eu e mais umas pessoas de
casa, meus conhecidos lá da época. Arrastei os pés pela sala, precisava ir no
banheiro mijar. Ouvia os meus ossos estalando, o chinelo arrastando no chão e o
cheiro do óleo na mobília de madeira. Não sei se estava viva ou morta, se é
pensamento sonhado na cabeça de alguém. Mas o demônio, ele sabe, isso e ainda
muito mais. Não tenho medo dele não por causa da minha fé, faz tempo que me
ensinaram a me defender, a rezar...”
E o demônio ri. Porque
no fundo é tudo muito engraçado mesmo...