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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

FUGA PRA DEBAIXO DO NARIZ


"Então, Calebe fez calar o povo perante Moisés e disse: Eia! Subamos e possuamos a terra, porque, certamente, prevaleceremos contra ela".

Números Cap. 13, v. 30.

No dia 04 de fevereiro de 2013 a polícia capixaba divulgou a notícia da prisão de José Alayr Andreatta, réu condenado em todas as instâncias judiciais como mandante do assassinato da jornalista Maria Nilce dos Santos Magalhães, ocorrido em 05 de julho de 1989. As surpresas dessa prosaica captura foram muitas, afinal, Andreatta estava foragido desde julho do ano passado e - muito longe de se esconder em alguma caverna no Cazaquistão - curtia uma espécie de aposentadoria em Jardim da Penha, bairro praiano, considerado nobre na cidade de Vitória.

Atentem para o detalhe irônico na camiseta "submarina" que Andreatta usava no momento de sua prisão. É ou não para pensar que o sujeito "estava mergulhado"? (Imagem da TV Gazeta-ES)




A reportagem anunciando a prisão de José Alayr Andreatta, veiculada na 2ª Edição do telejornal da Rede Gazeta, afiliada Globo no Espírito Santo, adotou um ar curiosamente respeitoso para com o foragido da justiça. Mesmo tom distante e asséptico, é bom dizer, adotado de maneira geral pela mídia capixaba com relação ao caso Maria Nilce ao longo do tempo. O repórter tratou Andreatta como “empresário” e disse que a prisão fora “por acaso”. Afirmação que passa subjetivamente – sem intenção talvez - a ideia de que o empresário fora preso “por engano”. A frase foi a seguinte:


O empresário José Andreatta foi preso por acaso, ele saia de um supermercado no bairro Jardim da Penha em Vitória, quando foi reconhecido pelo delegado Danilo Bahiense.


Nem é preciso ler nas entrelinhas que, apesar de foragido, Andreatta não era necessariamente um perigoso bandido procurado, tanto que há meses morava despreocupado num bairro bacana e super populoso. Na questão da captura, o trabalho da polícia tem todo o mérito, mas o “esconderijo” do meliante surgiu através de uma denúncia anônima. Logo em seguida o repórter fornece um resumo do caso, mas bota resumido nisso, com o seguinte arremate:


O empresário José Andreatta foi apontado como mandante do assassinato, foi a júri popular em 2006 e condenado a 13 anos de prisão. O empresário recorreu da sentença em liberdade, mas teve todos os recursos negados. Não havendo mais possibilidade de recorrer, a justiça mandou prender.


Eu estou ficando maluco ou essa frase dá a entender que o homem foi preso por uma espécie de  implicância da justiça? Ora, ainda em 1989 a polícia federal apurou que esse tal Andreatta fretara o voo que dera fuga aos pistoleiros que mataram Maria Nilce e reuniu inúmeras outras provas de que o mesmo participara ativamente da articulação do crime enquadrando-o como mandante. Acontece que, com o chamado “amplo direito de defesa” - entenda-se, mais de vinte anos de recursos e apelações - o criminoso não havia sequer cumprido um dia na prisão. Somente em 2006 (!) José Alayr Andreatta foi julgado e condenado a 13 anos de cadeia. A reportagem prossegue dizendo que o mandato de prisão fora expedido em julho de 2012 e que "o empresário, na época, não foi encontrado".


Pois bem, foi se esconder debaixo do nariz da sociedade capixaba, entenda-se, o cotidiano nada clandestino dos botecos e supermercados de Jardim da Penha. Era mais um entre os inúmeros “tiozinhos gente boa” que frequentam o Pezão e o Bar dos Coroas. Ontem um conhecido meu, dono de um bar em Bairro República, disse que tomou um susto quando viu a notícia. Reconheceu Andreatta como frequentador regular de seu estabelecimento, inclusive, na companhia de policiais.  


Outra coisa curiosa são os comentários do delegado durante a reportagem, porque - sei-lá-porque - deram a entender que o Andreatta seria um coitado, vivendo em um apartamento minúsculo e dependendo da ajuda financeira de amigos. Será que era então para ter pena dele? O pior é que ninguém deu conta de explicar quem eram esses tais que ajudaram o empresário em sua doce clandestinidade pública. E, quinto parágrafo: quando foi que acobertar foragido da justiça deixou de ser crime?


Para colocar a cereja no bolo, o repórter abre o microfone para que o “empresário”, após tudo descrito aqui, tenha nova oportunidade de balbuciar sua inocência no telejornal de maior audiência do Espírito Santo.


Não tinha motivo nenhum pra matar, dentro do processo não tem uma prova, não tem nada contra mim. Eu nunca tive... Num fui condenado nada. Por que ia matar essa mulher?


O homem parecia desorientado, o que é natural quando a casa cai, enquanto isso o repórter explicava que “para a justiça José Andreatta mandou matar Maria Nilce por vingança”. Vem então o delegado Danilo Bahiense que, aliás, merece todo nosso respeito e admiração pela prisão deste assassino, reproduzir involuntariamente as velhas lorotas ditas por Andreatta no estilo do crime organizado que tem a notória prática de transformar a vítima em réu para justificar covardias e atrocidades.


Ele disse que a jornalista extorquia alguns empresários e estava querendo extorqui-lo também e ele não aceitou. E ela acabou divulgando de que ele teria se casado com um travesti naquela ocasião. Segundo consta esta teria sido a motivação.

Neste momento está entendido o crime, certo? Defesa da honra, só para justificar o último argumento, porque os anteriores são mentiras cabeludas, mas nada disso foi explicado para o público; foi, isso sim, veiculado impunemente, torno a dizer, no televisivo de maior audiência do Espírito Santo. Alguém pode explicar qual era a empresa poderosa que esse senhor Andreatta era dono em 1989 que mereceria o achaque da colunista social de maior importância e, ela sim, uma empresária bem sucedida, proprietária do segundo maior jornal de circulação diária na cidade de Vitória?


Em suma, todo o episódio dessa reportagem absurdamente desrespeitosa para com a memória de uma pessoa assassinada a sangue frio num caso que chocou o país é apenas a prova de que temer, respeitar, dar ouvido e até razão a “alta bandidagem” é ainda algo bastante trivial na sociedade capixaba. A culpa não é do repórter, nem é dos entrevistados. A criminalização de Maria Nilce, e de muitas outras vítimas de casos escabrosos, começa lá atrás e tem a ver com a corrupção de muita gente respeitada, temida e considerada “importante” no Espírito Santo. E a grande mídia - por pressão, influência e sobrevivência - com estes sempre foi conivente e condescendente.


José Alayr Andreatta foi julgado e considerado culpado, que cumpra sua dívida com a sociedade. Porém, é bom lembrar que as investigações da polícia federal o consideraram um “peixe pequeno” e que havia indícios do envolvimento de gente bem acima dele na hierarquia do “crime organizado” no Espírito Santo. A promotoria da época lamentou o fato de não ter sido possível chegar aos maiores financiadores do crime escabroso que vitimou Maria Nilce. Somente com muito custo conseguiram indiciar alguns dos operativos, os homens de campo e, ainda assim, só agora, quase vinte e quatro anos depois, um deles foi parar na cadeia. Agora, nos resta ainda saber se o "empresário" vai ficar mesmo por lá...


Segue o link da reportagem da TV Gazeta comentada acima, para que todos possam julgar a partir de sua própria percepção:




Para quem não sabe nada do crime que vitimou Maria Nilce Magalhães segue reportagem publicada no prestigioso site do Proyeto Impunidad que denuncia o assassinato de jornalistas na América Latina:




E segue outro texto de Juca Magalhães sobre o assunto, publicado no site Observatório de Imprensa, tido como o mais importante sobre jornalismo no país.



http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_o_ultimo_crime_contra_o_jornal_da_cidade

sábado, 12 de maio de 2012

TEORIA DA CONTRADIÇÃO - PARTE II: O ESPÍRITO SANTO NO REAHAB!


Vós tendes por pai o Diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai; ele é homicida desde o princípio, e nunca se firmou na verdade, porque nele não há verdade; quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio; porque é mentiroso, e pai da mentira.

João 8:44

Vários matadores de aluguel fizeram fama e fortuna no Espírito Santo, por essas e por outras o capixaba ganhou status de cabra perigoso em determinadas regiões do país. Curiosamente, alguns desses bandidos gozavam de certo respeito social como fossem aqui um “Zeca Diabo”. Eram temidos, claro que eram, mas, estranhamente bem considerados por muita gente boa. Talvez destes o mais famoso seja o famigerado Zé Scardua, mas depois deles muitos outros fizeram “sucesso”, como outro Zé, o Sasso; assassino acusado da maioria dos crimes escabrosos dos anos oitenta. Morreu envenenado na cadeia em Linhares no dia 17 de setembro de 1992.

Zé Scárdua - Zeca Diabo numa versão capixaba? 


A demanda por trabalho da pistolagem vingou entre pessoas poderosas do Espírito Santo que não seriam automaticamente consideradas criminosas por ninguém, nem por eles mesmos. Porém, vez por outra rolava a necessidade de abandonar “de leve” o “fair play” e mostrar “aos pacatos o rumo do cemitério”. Uma hora era preciso desarticular um grupo opositor, ou vingar de pronto alguma questão que a justiça levaria anos para resolver, ou simplesmente silenciar e ocupar o espaço de algum concorrente. Porém, a logística dessas operações era coisa complicada e oportunizou o surgimento de especialistas em ações armadas, sedição, corrupção e algo mais.

Nesse inacreditável, porque pavoroso, cenário mercenário de faroeste caboclo despontou o delegado Claudio Guerra, cara que tinha um Grupo de Operações Especiais só pra chamar de seu. Posava de poderoso entre os poderosos e morava em um sonoro apartamento “de um por andar” no ponto mais valorizado do bairro nobre da cidade de Vitória. Curiosamente, não há notícia de alguém ter se perguntado como é que um delegado que – até onde era seguro saber - vivia com o salário da Policia Civil, morava nas mesmas condições que os cidadãos mais ricos do Espírito Santo. Esse assunto não era da conta de ninguém.

Os homens de bem não costumam se meter na vida dos outros: fazem vista grossa e até censuram opositores que ameaçam abalar a paz dos poderosos. Basta lembrar o culto, a pompa e a circunstância em torno do bicheiro José Carlos Gratz, cujas ligações com contravenções piores dificilmente poderiam ser ignoradas pelas autoridades civis e militares da cidade. Foi eleito deputado e alçado à presidência da Assembléia, cultuado a ponto de comemorar o aniversário na boate Zoom em Camburi numa espécie de beija-mão escandaloso no qual se ajoelhou a seus pés boa parte do Pib capixaba; mais de cinco mil pessoas era o número que se comentava na ocasião.

Gratz, na época que era "locomotiva" do volúvel Jet Set  dos capixabas

O material sobre os feitos do delegado Claudio Guerra e de José Carlos Gratz é farto, não estou falando nenhuma novidade escabrosa aqui, basta uma pesquisa rasteira pela Internet e jornais antigos para acessar um variado perfil barra-pesada dessas pessoas e de outras da dita “alta sociedade capixaba”. Foi só quando a situação se tornou insustentável e o estado francamente ingovernável é que foi pedido socorro a uma força tarefa federal para resolver a questão. O Espírito Santo é assim: de vez em quando parece que sua máquina precisa ser internada numa clínica de reabilitação para se desintoxicar. 

Guerra em foto publicada no site da CBN sobre desvios de dízimo na Assembléia de Deus (!)
Apesar do passado sangrento e covarde, porque se especializou em atuar armado contra pessoas indefesas, o delegado Claudio Guerra, hoje está por aí: livre, leve e solto; posando circunspecto e risonho de bíblia debaixo do braço. Como se não bastasse ainda resolveu contar suas estripulias mais famosas num livro de memórias do tempo em que matava a mando da ditadura e sempre que tem oportunidade, menciona (orgulhoso?) que atuou para a elite capixaba também. Uma destas suas afirmações mais polêmicas recentes envolve o conhecido empresário e deputado federal Camilo Cola. Segue detalhe da reportagem publicada no IG:

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É nesse ponto que voltamos à triste história da menina Araceli, porque como foi dito, uma das mais funestas características do crime de mando no Espírito Santo é a criminalização da vítima. A prática é útil para bagunçar a investigação, ouriçar a mídia e manipular a opinião pública contra o morto. Isso intimida os familiares que, por vergonha da própria impotência – quando percebem que o estado está jogando contra - se afastam com medo, se omitem. E ainda são criticados por isso, como fez o jornalista Zé Maria Batista. Poucos são os que têm a iniciativa de ir para a rua com um cartaz na mão e “dar barraco”, porque imaginam que o máximo que conseguirão é exposição na mídia que sabe que a baixaria é o que mais capta a atenção do público e descaradamente transforma tragédia e sofrimento em show na hora do almoço.

Esse público, aliás, parece ter necessidade de se convencer que um crime bárbaro atinge apenas aos que de alguma forma mereceram ou procuraram. E isso não é assim! Existe gente ruim em nosso meio e elas têm que ser punidas!! Ou será que uma menina de menos de dez anos merecia ser estuprada e morta por um bando de malucos porque não tinha dinheiro para bancar uma passagem de ônibus para casa? Mesmo que sua mãe fosse traficante e envolvesse a menina no leva e trás, será que é certo dizer que foi pouco o que aconteceu? Não vou nem comentar a acusação contra Camilo Cola, acho bom Claudio Guerra conseguir provar o que disse, mas e a grave acusação de extorsão contra o jornalista Jeveaux? Quem vai o defender?

A mesma acusação de desonestidade é sempre feita contra vítimas de crimes do gênero. A jornalista Maria Nilce, que nada tinha a ver com o assunto, foi denegrida – de passagem - em uma medíocre carta anônima que divulgava fofocas e graves acusações contra o judiciário capixaba. A mesma coisa já foi dita com relação ao arquiteto Bebeto Viváqua, executado ao meio dia numa rua movimentada de Jardim da Penha, durante um suposto assalto cujo caso foi “solucionado” pela equipe de Claudio Guerra na época em que tudo ainda estava sob seu controle. Matavam, “investigavam” e prosperavam a olhos vistos. Hoje parece que Guerra se arrependeu dos crimes cometidos, encontrou Jesus e, como vimos acima, está levando seu know how para a Assembléia de Deus.  


Trecho da "infame" carta anônima

E só para arrematar: o julgamento dos dois últimos acusados no crime que vitimou a jornalista Maria Nilce Magalhães em 05 de julho de 1989 (!), estava marcado para essa semana, mas foi adiado para o início de junho deste ano. Um dos réus trocou de advogado e este pediu um tempo para preparar sua defesa. Agradecemos todo apoio manifestado até agora, hoje mesmo fomos surpreendidos pelo telefonema do prefeito Ronaldo Resende, de Oliveira em Minas Gerais. 

Vamos sempre lutar e denunciar essas calúnias rasteiras, para que toda a verdade desses crimes venha à tona; para que um dia se faça justiça às famílias - como a minha - que sofrem com essas mentiras que maculam a dignidade de nossos entes queridos; para que, finalmente, possam descansar, eles sim, na santa paz de Deus.