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terça-feira, 20 de abril de 2010

SABE MAIS QUEM SABE QUE NÃO SABE, SABE?

Pessoas que pensam que sabem, não sabem e ainda pensam que o ignaro é você, é uma situação que rola. Essa questão chegou chegando pela via da lembrança e não da lambança. Estudei piano com um amigo querido e já falecido faz tempo, chamava-se Josué Louzada. Meu professor sempre tentava baixar a minha inflamada bola pianeira lembrando uma frase que até hoje não sei de quem é e que era mais ou menos assim:


“O mau aluno é aquele que pensa que já sabe tudo, se bobear vai querer ensinar ao professor aquilo que ele mesmo desconhece. Esse não vai dar em lugar nenhum, porque em sua arrogância fechou as portas ao conhecimento. Já o bom aluno é aquele que tem consciência que não sabe e por isso mesmo está em busca do conhecimento, esse está aberto a aprender e poderá seguir em frente. Existe também o aluno excepcional, o dito gênio, este sabe e nem sabe que sabe.”


Lembrei de algumas situações engraçadas que passei com pessoas que teimavam estarem certas e que depois de muito brigar chegavam a conclusão de que o “burro” era eu. Tive uma estagiária que teimou comigo – ela da geração Internet – que o verso de um envelope é o lugar onde se escreve o nome do remetente e que a frente seria aquele lugar onde se abre e fecha, por exemplo, uma carta. Nem se Jesus voltasse – a menina era evangélica – teria a convencido do contrário. Eu bem que tentei, mesmo porque estava sendo preparada uma correspondência para enviar e se as etiquetas com nomes de remetente e destinatário ficassem invertidas seria uma baita confusão. No final deixei ela resmungando minha burrice e colando as etiquetas no lugar certo ainda que ela o denominasse errado.



Outra situação comum é a pessoa entrar numa de que você não sabe nada sobre um determinado assunto o qual você domina e o infeliz, supondo ignorância, resolve te testar. Trabalhei em um evento em que apareceu um bebum chato pra cacete – desculpe a redundância – que após tomar uns patrázes resolveu testar meu conhecimento perguntando quantas sinfonias Beethoven tinha composto. Pensando estar conversando com algum musicólogo querendo me aprontar uma pegadinha, disse que se levarmos em consideração a décima que ele havia deixado esboços, inclusive com uma gravação muito comentada... Fui interrompido pelo chato, agora feliz da vida:



- Rá! Num falei que você num sabia de nada! Beethoven só compôs nove sinfonias. Ruárarara! – Que situação bacana, o cara tinha me pegado na contra-mão do conhecimento. Claro que Beethoven compôs nove sinfonias, saber que existem gravações da décima, feita a partir de esboços e querer a incluir no ciclo "oficial" seria um preciosismo que me desqualificaria, por exemplo, em algum teste escrito. O chato foi pensar que estava conversando com alguém que entendia da coisa e no final passar por ignorante, afinal, saber que Beethoven escreveu nove sinfonias é mole, queria ver me responder quantas escreveu Chopin ou Villa Lobos...


Quando esse tipo de situação ou discussão chega no campo da espiritualidade é que a vaca vai mesmo pro brejo. Não são poucos, especialmente os recém-convertidos, plenamente convencidos de suas crenças e que se vêem no dever de as disseminar pelo mundo, supondo antecipadamente que o outro, qualquer outro, é um ignorante e que precisa de sua pregação para se redimir. Pior é quando você dá uma de filósofo elegante para se esquivar do chato e fala “Amigo, eu só sei que nada sei”. Pronto. Bastou admitir sua ignorância e aquele que pensa que sabe – muito provavelmente desconhecendo Sócrates – se vê no direito bíblico de salvar sua alma.


Só a título de “coda”, encontrei hoje uma frase em uma agenda antiga que resume para mim essa questão da espiritualidade, porque estou longe de saber alguma coisa – fora esse negócio das sinfonias de Beethoven - eu continuo sem saber e buscando...


“Os pecados cometidos pelo homem não são uma grande culpa, pois a tentação é poderosa e suas forças irrisórias; a grande culpa do homem é que a cada momento ele pode seguir o caminho de retorno e não o faz” “Quellenangabe”

Um comentário:

Anônimo disse...

Fala aí, meu companheiro...
Gostei muito do texto. Muito bom mesmo... e faz sentido rsrss...
Sempre bom ler suas crônicas. Sinto-me honrado em poder ler seus escritos.
Sucesso sempre, caro Juca.
Bom feriado.
Abraços

Rico Chagas.