Quarta no final da
tarde, baita correria. Passo no cartório pra reconhecer firma em um documento e
agora tem senha, então pego a verde. Falta umas dez pessoas ainda pra chegar minha
vez, dou graças a Crom (Hehehe) que a bateria do tablet não acabou. Leio o
número mais recente de O Inescrito, ou será que era o Flash Gordon? Tenho um
antigo, daqueles grandões da Ebal, que ando pensando em me desfazer, mas cadê o
tempo? Tô eu sentado dentro do cartório.
Lá no canto vejo um
homem que me parece um velho conhecido, daqueles que há vinte anos eu chamava
de amigo, com quem confidenciava questões pessoais e saía no final do
expediente pra tomar umas cervejas. O cara envelheceu ao ponto de agora eu não
poder mais dizer com certeza se é ele ou não. Imediatamente penso que também
devo ter envelhecido aquele mesmo tanto e isso me deixa um pouco amuado... Isso
e aquele papelzinho idiota da senha entre o dedão e o indicador.
Absorto em alguma
espécie de cálculo, folheando documentos que serão reconhecidos, o homem não vê
nada à sua volta. Penso divertido que possa provavelmente ter me visto o
encarando com o canto dos olhos e agora foi tomado pela paranoia bastante
improvável de ser um paquera, amigo bom é sempre meio doido. Ainda estava em
dúvida se era o cara ou não quando ele, absorto nos papéis, começou a passar a
mão no rosto de maneira familiar. Caio na real que foi, aliás, esse tique
nervoso que me chamou a atenção e agora confirmou sua identidade.
Alguns anos nas costas
faz miséria com a “informação visual” da gente: calva bastante acentuada,
pancinha também, óclinho de leitura, o pacote completo de quem chegou na faixa
dos cinqüenta sem passar perto da academia. Devo mesmo estar ficando velho, ando
pensando com naturalidade que fazer Pilates já não é mais uma idéia tão absurda
assim. Um cara colocou no twitter que se deu conta da idade quando se pegou
matutando: “Esse é um bom chuveiro, quero comprar esse chuveiro”.
Amigo antigo
reconhecido, agora a questão é acelerar. Tenho um monte de coisas pra fazer embora
saiba que “o cemitério está cheio de gente que nunca perdeu tempo”. Se retirar
o indivíduo de seu limbo introspectivo teremos duas décadas para colocar em dia,
vai ser um problema danado e é já cinco da tarde. Ademais, falta só um número
para a minha senha. Chamaram a dele. Passou bem na minha frente com a cabeça
baixa e nem me viu. Pensei: deixa ver suas coisas, quando terminar falo com
ele.
Então o painel deu um
“bip” e apareceu meu número, o guichê bem a seu lado. Passei os contratos para
a moça que me fez algumas perguntas. Quando fui ver o velho amigo já ia longe,
atravessando a porta apressado. Lembrei de histórias engraçadas, as insanidades
que nos trouxeram com dificuldade à meia idade. Lembrei também de algumas
coisas desagradáveis, junto com coisas bacanas a memória sempre traz algum lixo.
Lá fora o cara desapareceu, fico imaginando que tudo esteja bem em sua vida e desejo
que só as lembranças boas nos acompanhem, sabe-se-lá quando vamos não nos ver
novamente...
Nenhum comentário:
Postar um comentário