Sempre achei
que era um cara muito bom em ouvir críticas, presto atenção e procuro melhorar,
mas de uns tempos para cá sinto que um monte de coisas que eu achava a meu
respeito caducaram. Por exemplo: sempre acreditei que me dava super bem com os
gays e outras “diferenças”. De uns tempos para cá comecei a perceber que,
apesar disso, ainda tenho preconceito sim e que não os respeitava realmente,
integralmente, como deve ser. Os homoafetivos são pessoas comuns e não tem nada
de extraordinário em uma pessoa ser o que ela é. O problema é que corrigir algumas
facetas desse nosso “jeito de ser” é tão difícil quanto arrancar um dente
sozinho.
Vou dar um
exemplo besta que vai levar essa conversa para outro lado (respirem aliviados
seus preconceituosos):
Estava
apresentando a inauguração de uma Academia Popular e minha chefa chamou atenção
para o fato de que eu falava “acadimia”. Foi uma crítica que na hora estranhei,
pensei mesmo assim: “Qual o problema?” Depois entendi: ora, o problema é que
não é assim que se pronuncia a palavra. Simples assim. Toca a aprender a falar
direito “minino”! O pior é que havia umas quarenta “Acadimias” pra inaugurar e
foi um baita exercício mental manter aquele “e” no lugar certo. Toda vez que ia
falar era preciso repassar o “e” na cabeça, aí vinha alguém, me distraía, e
quando eu ia ver tinha falado “acadimia” de novo.
Fiquei encafifado
com aquilo: de onde será que saiu esse mau costume no meu jeito de falar? Será
que é coisa da pronúncia do capixaba? Fiquei reparando e vi que a maioria das
pessoas falava certo, menos eu, que me julgava tão lido e escrevinhado. Comentei
a Zika com minha esposa que, muito condescendente e solidária, opinou que devia
ser “coisa de velho”. Possibilidade que bem que podia me ter passado “dispercebida”.
Passei a notar que eu falava muitas outras coisas com aquele mesmo “sutaque”, praticamente
tudo. Falávamos nisso e na televisão passou uma cena antiga com Paulo Autran que
mandou um sonoro “dipois”. Virei pra ela e falei: olha lá! E a rebatida veio
certeira: “Num falei que era coisa de velho”...
Fiquei amuado
feito um fedelho diante de um prato de buchada, mas “dipois isqueci” o assunto.
No final do
ano, no auge da confusão dos playboys contra o Chico Buarque fiz uma singela declaração
a seu favor no Facebook e teve gente que achou ruim eu “defender bandido”. “Que
saco! – Pensei – A gente não pode mais nem ter opinião!” Só de vingança baixei
a discografia todo do filho do “Doutor Progresso”. Um dia, indo pro trabalho, o
“player” do celular tocou aleatoriamente a canção Olhos nos Olhos. Qual não foi
a minha surpresa quando lá pelas tantas o Chico mandou um sonoro “bem mais e
“milhor” que você”. Com a mesma acentuação da palavra milho. Pensei: Pô, mas o
Chico pode...
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